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Diplomacia para a Paz e Multilateralismo- A Cooperação Supranacional UE-ONU

  • Maria Carolina Dias
  • 30 de abr. de 2021
  • 7 min de leitura

A União Europeia e a ONU foram quase construídas nas mesmas bases, visto que houve uma procura mútua no sentido de preservar e promover a paz no pós-Segunda Guerra Mundial. Segundo o EU Global Strategy on Foreign Policy and Security, um documento publicado em 2016 pela European Union Global Strategy, e sob o lema Shared Vision, Common Action: A Stronger Europe, o multilateralismo é o princípio chave e a ONU o parceiro essencial para toda a estratégia europeia de tornar a UE mais forte e capaz de fazer frente às crises que a cercam. Ambos são projetos de paz, sendo que “on the whole I can again say that the EU is indeed the natural partner of the United Nations and both organizations have been born out of the same experience, the experience of war, and are founded on the same conviction that acting together is much better than acting alone, even if we sometimes have to compromise in order to go on.” (Ferrero-Waldner, 2005). Enquanto projetos de paz, que partilham os mesmos valores e princípios do pós-Segunda Guerra Mundial, podem ser vistos como naturais aliados. Tanto a UE, como a ONU, têm ações ditas paralelas no que se refere a uma solidariedade constante e aos compromissos para com os países em desenvolvimento.



De forma a fazer frente a desafios, crises e ameaças, que têm vindo a multiplicar-se e a adotar uma dimensão internacional, é cada vez mais necessária a existência de uma linha de ação comum, ou seja, um sistema multilateral que se demonstre apto, e que atue com base em regras e valores universais, valores estes que respeitam fundamentalmente a paz e segurança, os princípios da democracia, o Direito Internacional e o desenvolvimento sustentável. Sabe-se, então, que os objetivos da UE vão de encontro aos da ONU, e que há uma ação conjunta para que estes princípios sejam alcançados e perpetuados. Para além desta linha de pensamento e ação, a UE procura ainda que, através da sua ação junto da ONU, consiga afirmar-se como um ator global no contexto internacional.


Apesar dos EM da UE coordenarem as suas ações no âmbito da ONU para fazerem prevalecer a vontade europeia, existem questões onde os interesses nacionais de cada país predominam, fazendo com que, faltando coerência interna na UE, o papel desta organização na ONU falhe. A questão das migrações, por exemplo, acaba por ser muito problemática. Durante as discussões sobre o Global Compact for Safe, Orderly and Regular Migration no seio da ONU, a ação coletiva da UE demonstrou-se bastante fragmentada. Existiu uma posição comum durante algum tempo, porém, a partir de 2018, a Hungria começou a afastar-se da linha de ação europeia. A Bulgária também começou a distanciar- se, com o argumento de que estes apoios prejudicariam os seus interesses nacionais. Numa votação realizada em dezembro de 2018 na AGNU sobre o Global Compact for Safe, Orderly and Regular Migration, esta matéria contou com a abstenção de cinco EM da UE (Bulgária, Áustria, Itália, Letónia e Roménia), bem como três votos contra por parte da República Checa, da Hungria e da Polónia.


A UE apoia a Action for Peacekeeping Initiative das Nações Unidas (A4P) e a Declaration of Shared Commitments on UN Peacekeeping Operations. Um dos instrumentos mais eficazes da ONU na promoção da paz e segurança internacionais, algo que a UE também procura promover, é precisamente a iniciativa A4P, que é considerada o cerne para a agenda de ação das NU nos projetos de peacekeeping. É uma iniciativa que foi lançada para reorientar o peacekeeping, reforçando as missões e operações no terreno, mobilizando apoios para soluções políticas e, ainda, equipamentos e treino para as forças locais (United Nations). António Guterres vê a UN Peacekeeping como “a remarkable enterprise of multilateralism and international solidarity. Action by the Secretariat alone is not enough to meet the challenges we face”.


A incapacidade cada vez maior para dar resolução a conflitos, que na sua maioria surgem como regionais, mas que acabam por ter repercussões em todo o mundo, tem vindo a originar cada vez mais medidas protecionistas. As instituições têm vindo a melhorar as suas respostas, mas as atitudes de Positive Peace têm vindo a desgastar-se ao longo dos últimos anos. A Positive Peace é um indicador que transmite os resultados para um futuro pacífico. Altos níveis permitem que, por exemplo, haja uma melhor resposta na recuperação a impactos vindos do exterior e que são impossíveis de evitar, como o caso da recente pandemia. Mas se a Positive Peace continua a sofrer este desgaste, e as organizações que “suportam” a Comunidade Internacional, como a ONU e tudo o que a engloba, não tiverem o apoio necessário, é provável que a paz mundial continue a degradar- se, até não existir mais (Institute for Economics & Peace, 2020, p. 7).


A ONU e a UE, face à recente multiplicidade de ameaças e conflitos, estabeleceram novas prioridades para a cooperação em operações de paz entre 2019 e 2021. Estas prioridades vêm reforçar a missão estratégica de ambas as organizações na promoção do multilateralismo e, também de certa forma, proporcionar a existência de uma resposta mais assertiva às problemáticas que têm vindo a surgir cada vez mais no mundo.


As oito prioridades passam então, como por exemplo, pela definição de uma plataforma de cooperação sobre a questão Women, Peace and Security, para que se concretize uma maior participação de mulheres em processos de paz e uma maior integração nas perspetivas de género em todas as fases dos projetos, e a consolidação da cooperação entre missões e operações para haver uma maior garantia de reciprocidade na partilha de recursos, e na continuidade destas. Há ainda a procura do fortalecimento da cooperação em questões de Estado de Direito e de reformas em áreas relacionadas com a segurança e estruturas de justiça. Uma outra prioridade, e que é muito relevante, é a melhoria do apoio em operações de paz coordenadas por países africanos, procurando, juntamente com a União Africana, iniciativas para uma cooperação com a UE e a ONU, uma cooperação UE-ONU-UA (United Nations Peacekeeping, 2018). Só com cooperações deste género, com grandes contribuidores, é que é possível maximizar os recursos, que são finitos, do peacekeeping.



O covid-19 tanto pode vir a significar uma oportunidade para “revitalizar” o multilateralismo ou, como muitos temem, que a nova realidade venha a ser um sistema marcado pela rivalidade e isolacionismo. A UE tem vindo a apostar na contínua promoção da saúde como um bem público global, continuando a sua ação no âmbito da OMS. A UE procura trabalhar em conjunto com os seus parceiros de forma a apoiarem a agenda da ONU “recover better” em tempos de covid-19, para haver a estratégia para uma recuperação sustentável, que vá de encontro com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, o Acordo de Paris e o European Green Deal (European Union External Action, 2020).


A União Europeia é um projeto de paz, mas a paz é algo instável, e os conflitos que têm vindo a multiplicar-se ao redor do globo trazem consequências para o projeto europeu, consequências estas que são inevitáveis. A ONU é também um projeto de paz, e está constrangida às dinâmicas e transições de poder internacional. Continua a existir uma contínua cooperação com a ONU em áreas que respeitam as questões da paz e segurança internacionais, relação esta que é cada vez mais ambiciosa. A UE e a ONU trabalham ainda em conjunto para erradicar a fome mundial. Coletivamente, os EM do projeto europeu financiam em 40% o World Food Programme. A UE irá necessitar de ter uma ação mais estratégica junto da ONU, e de um maior investimento nesta cooperação, liderando pelo exemplo.


As crises e tensões têm vindo a ter impactos que se demonstram de dia para dia cada vez mais acentuados e violentos. Existe uma crescente complexidade das causas por detrás dessas crises, e que põe em causa a paz e segurança internacionais e, por isso, a cooperação entre a UE e a ONU manifesta-se, não como uma escolha ou opção, mas sim como algo que é imperativo para a construção de um futuro (e presente) pacífico.





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